O Sereno da Noite

Capa do disco O Sereno da Noite

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Inaugurado pelo multinstrumentista e compositor Rafael Senra em 2019, o Alfa Serenar apresenta agora seu quarto álbum, com uma fusão única de rock progressivo, pós-punk e música brasileira, que promete surpreender os fãs e conquistar novos ouvintes.

Seguindo a linha progressiva com letras em português que marcou o álbum anterior, Cobra Sofia e outras lendas amazônicas, lançado em 2022 pelo selo polonês Progshine Records, O Sereno da Noite apresenta um repertório ainda mais soturno, etéreo e misterioso.

Rafael Senra, como de costume, toca todos os instrumentos, e dessa vez executou também as baterias.

A mixagem e masterização do trabalho foram feitas pelo produtor Alan Flexa (Estúdio Zarolho).

Lançamento Progshine Records.

01 – Nova Arcádia (Rafael Senra – Luiz Henrique Garcia) (08:16)
02 – Nada Selvagem (Rafael Senra – Kadu Mauad) (06:34)  
03 – Twisted Lines (Rafael Senra) (04:05)
04 – Angelus Novus (Rafael Senra) (05:16)
05 – Estrela da Manhã (Rafael Senra) (09:11)

História

O Disco O Sereno da Noite (2023) reúne músicas antigas e novas de Rafael Senra, e o critério para a escolha do repertório foi a de reunir um trabalho que soasse nostálgico, soturno e misterioso. Diferente do disco anterior, Cobra Sofia e outras lendas amazônicas (2022), que tinha um som mais direto, intenso e letras sobre temas míticos amazônicos, O Sereno da Noite traz uma poética mais subjetiva e introspectiva.

Outra diferença em relação aos discos anteriores do Projeto Alfa Serenar é que esse trabalho não tem caráter conceitual: apesar do tema da noite batizar o disco e apontar sua sonoridade, as músicas não dialogam entre si e nem fazem parte de uma história mais ampla (mas claro que os ouvintes podem ficar a vontade para fabular narrativas entre cada uma das canções, afinal, as obras de arte são abertas e dadas a infinitas interpretações).

Contracapa do disco “O Sereno da Noite

A maior parte das músicas foi gravada do zero em meados de 2022, no home estúdio de Rafael Senra. Mas algumas faixas são mais antigas. “Twisted Lines” e “Estrela da Manhã” são duas faixas que Rafael tem gravado e regravado em seu estúdio há mais de dez anos, e que agora chegaram em sua versão final.

No segundo semestre de 2022, Rafael já tinha pronto boa parte do disco: gravou em casa os vocais, violões, guitarras, baixos e teclados. Algumas participações especiais que estavam programadas não aconteceram por questões de agenda, e, diante desses cancelamentos, Rafael pensou que seria interessante dessa vez tocar todos os instrumentos do disco. O disco anterior, por exemplo, contou com baterias do músico amapaense Forlan Gomes, e orquestrações de câmara feitas pela musicista venezuelana Betânia Hernandez.

Rafael gravando as baterias de O Sereno da Noite

Apesar da bateria ter sido o primeiro instrumento que Rafael tocou profissionalmente na vida, ele nunca tinha tido coragem de tocar o instrumento em seus discos, temendo que não conseguiria manter as batidas no tempo do metrônomo, ou talvez dar a “pegada” necessária em cada música. Mas depois de treinar um pouco, Rafael enfim gravou as baterias no Estúdio Zarolho, em um processo conduzido pelo produtor Alan Flexa – conhecido internacionalmente por suas produções especializadas em MPB, rock e som progressivo. Após essa etapa, Alan fez as mixagens e masterizou o trabalho, usando uma abordagem 3D que tenta trazer uma maior ambiência no resultado final. Na masterização, Flexa mescla tecnologia analógica e digital, usando equipamentos valvulados e transistorizados que processam o som em um computador digital de última geração.

As canções

Luiz Henrique Garcia

Nova Arcádia: a faixa de abertura de O Sereno da Noite foi uma das últimas canções finalizadas. Mas ela resume o tom soturno do trabalho inteiro, motivo pelo qual foi escolhida como “primeiro ato” do disco. A melodia e os arranjos foram compostos por Rafael, e a letra ficou à cargo de Luiz Henrique Garcia, conhecido por suas parcerias musicais com nomes como Makely Ka, Lo Borges, Pablo Castro, Dan Oliveira e muitos outros.

A canção, que originalmente tinha apenas o arpejo de violão inicial e a parte de letra, ganhou arranjos nitidamente progressivos nessa versão, com direito a uma pomposa introdução de teclados, e trechos instrumentais com vários andamentos na parte final.

Kadu Mauad

Nada Selvagem: a segunda faixa do disco traz uma composição de Rafael Senra e letra de Kadu Mauad, músico e letrista radicado em Juiz de Fora, parceiro de artistas como Hermínio Bello de Carvalho, Cacaudio, Roger Resende, dentre outros.

O processo de gravação dessa música foi longo, complexo, e, de acordo com Rafael, mereceria um texto à parte. Sua gravação original trazia um tema no estilo anos 80, com uma base dançante e uma sonoridade radicalmente diferente da versão original. Mas a letra de Kadu trouxe um universo simbólico bem distinto da gravação, remetendo a um eu-lírico que abandona o mundo conhecido e se embrenha na natureza selvagem.

Diante desse impasse paradoxal, Rafael resolveu descartar a outra gravação e começar do zero, com outra tonalidade e um novo arranjo. Essa nova abordagem contou com o imprescindível auxílio de Kadu (que, além de letrista, é um músico e arranjador de primeira linha). Kadu foi o responsável pelo arranjo de violão da introdução e das estrofes, e foi uma espécie de “diretor vocal” da gravação final, fazendo um mapa da letra e dando indicações de como deveria ser a interpretação. O resultado final de “Nada Selvagem” deve muito ao trabalho de bastidores de Kadu.

Capa do single Twisted Lines

Twisted Lines: originalmente, essa canção se chamava “Linhas Tortas”. Foi uma das primeiras que Rafael compôs na vida, mas que acabou resistindo ao teste do tempo. Afinal, suas características melódicas típicas das harmonias do Clube da Esquina pareciam boas demais para que a música ficasse engavetada. O único problema era que a letra original parecia irregular, e a solução adotada foi compor uma letra em inglês (que, apesar da mudança de idioma, preserva o nome e a ideia dos versos originais).

Há alguns anos, Rafael fez uma pré-produção dessa faixa, com arranjos a la “Pink Floyd” que incluíam solos e arpejos com sonoridade bem espacial e psicodélica. A versão final de O Sereno da Noite preserva toda a estrutura dessa primeira gravação.

Pintura “Angelus Novus”, do pintor suiço Paul Klee (1920)

Angelus Novus: a composição melódica de “Angelus Novus” talvez seja tão antiga quanto a de “Twisted Lines”, datada provavelmente do ano 2000. Ela nasceu de maneira bem inusitada, quando o amigo Jorge Luis (Jorginho) lhe emprestou um box set da banda norteamericana Journey, chamado Time 3. O encarte repleto de fotos tinha um dado que chamou a atenção de Rafael: uma partitura com a introdução da música Separate Ways. Rafael tentou toca-la, e ficou fascinado com um recurso harmônico que desconhecia na época: o uso do baixo pedal (quando a harmonia da canção, apesar de avançar, mantém a mesma nota no baixo). Por não ter ainda uma habilidade técnica que lhe permitisse tocar Separate Ways da maneira correta, a tentativa desajeitada acabou gerando uma nova composição com harmonia em baixo pedal.

Em meados de 2009, ao ler o ensaio “Sob o conceito de história”, do filósofo Walter Benjamin, Rafael teve a inspiração da letra. Apesar de ser um texto crítico muito estudado nas áreas de humanas, a escrita de Benjamin (profundamente influenciada pela Cabala judaica) é repleta de evocações imagéticas intensas, e uma delas é a imagem do anjo que sobrevoa a história humana olhando para trás, como se visse uma verdadeira catástrofe de proporções apocalípticas. O teórico alemão não se contenta em imaginar nessa ingrata tarefa um anjo genérico qualquer, mas se reporta diretamente ao Angelus Novus representado em uma pintura do suíço Paul Klee. A letra de Rafael tenta recontar o mosaico de imagens perturbadoras que Benjamin suscita em seu ensaio, mas sem repetir as exatas palavras do teórico.

Em 2022, ao gravar a canção, Rafael percebeu que a letra tinha problemas na sua métrica, com as sílabas tônicas situadas nos lugares errados, o que problematizava bastante a interpretação ao cantar. Isso fez com que a letra fosse reescrita, preservando seu nome e suas ideias fundamentais.

Estrela da Manhã: esse tema instrumental tem sido regravado por Rafael ao longo de mais de uma década. Ele originalmente foi pensado para um disco chamado Cosmogonia, baseado na cosmogonia criada pelo moleiro Menocchio no livro O Queijo e os Vermes, de Carlo Ginsburg.

Capa do disco inédito “Cosmogonia” (2010)

A suíte Cosmogonia foi inteiramente gravada por Rafael em 2010, e consistia de quatro longos temas instrumentais, cada um remetendo a um dos elementos da natureza. Desses, dois foram lançados: o tema do fogo tornou-se a faixa “Veias e Led” contida no primeiro (e único EP) do Projeto Zastrados, chamado Lamparina, lançado em 2012 (e disponível no Bandcamp de Rafael Senra). Já o tema ligado ao elemento terra tornou-se a faixa “Estrela da Manhã”.

Ela destoa do clima sombrio dos temas anteriores do disco O Sereno da Noite. Apesar de não se tratar de um disco conceitual, Rafael quis que ele funcionasse como as suítes de uma ópera, e, se o álbum apresenta canções com aspectos mais noturnos, Estrela da Manhã representaria o movimento final que prepara para o nascer do dia.